Desde que há uns dois ou três anos atrás mantive contato com umser extraterrestre do planeta Aitsenoh, cuja nave avariada tivera que fazer um pouso forçado, num indizível fim de tarde, lá noSítio Samaris, meu interesse pela Ufologia aumentou tanto que comecei a gastar as minguadas sobras do meu parco e suado dinheirinho, destinadas inteira e irresponsavelmente às loiras geladas, comprando livros de terceira mão que tratam deste excitante assunto, nos sebos amistosos do beco da poeira da loira desposada pelo Sol. Além do que, precavido, mando capinar com relativa frequência o local onde o disco pousou, por trás de umas moitas viçosas de bananeiras, guardadas incondicional e placidamente por cajueiros gigantes, na esperança infantil de que haja, quem sabe, no futuro, um novo encontro com os simpáticos alienígenas - intelectualizados, bem-falantes, boêmios e socialmente críticos.
Assim, um dia desses, ao chegar ao meu pequeno e imorredouro refúgio ecológico, na Flamenga dos Reginos, e preparar-me para o trabalho prazeroso de aguação das fruteiras e das hortaliças, qual não foi a minha surpresa ao notar, na iridescência do sol matinal, um objeto de pequeno diâmetro, brilhante, que emitia um leve ruído. Medroso, mas com a curiosidade aguçada a mil, aproximei-me cautelosamente daquilo, seguido de perto pelo meu fidelíssimo guarda-costas canino, o Scooby Doo - um pulguento vira-lata de olhar mais triste que o meu e que, na falta de um outro besta, resolveu adotar-me incontinenti como seu dono. Pé ante pé, tentando não fazer barulho, com medo de aquela estranha parafernália fosse uma bomba armada pelos loucos daAl Quaeda, fui chegando cada vez mais perto e, quando estava a menos de um metro daquela coisa, ouvi nitidamente um insistente e esquisito chiado, seguido de vibrações sucessivas que quase desmontam a geringonça inteira. Aí, para meu espanto, apareceu subitamente uma espécie de tela de cristal líquido, onde o meuamigo feioso extraterrestre fazia uma inusitada e polida saudação direcionada exatamente a mim, além de explanar alguns comentários abalizados sobre nós, humanos.
Tentarei ser o mais exato possível na reprodução de sua fala – até por que foi dele próprio esta exigência, solicitando-me, penhorada e gentilmente, a divulgação do seu, digamos, discurso, sem nenhum corte ou censura prévia.
Eis, pois, na íntegra, a transcrição fiel da fala do ser interplanetário:
- “Salve, homenzinho da Terra! Salve! Somos-lhe eternamente gratos por tudo que fez por nós quando de nossa breve e desastrada passagem por este planetinha decrépito. Toda minha família – inclusive minhas irmãs - manda-lhe lembranças. Elas estão doidas para conhecer um terráqueo. Não mencionarei, por timidez, o motivo principal disso. Não tenha receio! Esta prosaica máquina decodificadora de idiomas foi deixada, por nós, ontem, no seu desarrumado quintal, enquanto dávamos um pulo até, ali, aos Anéis de Saturno, e lá soubemos, para decepção e surpresa nossa, das grandes safadezas que os humanóides maquiavelicamente andam a aprontar por aqui. Vocês, terráqueos imbecis, são a vergonha do Cosmos inteiro. Uma sub-raça mal cheirosa e estúpida que não evoluiu absolutamente nada no Plano Cósmico e que precisa mudar radicalmente todas as suas vis e estapafúrdias atitudes, bem como seus idiotas e mesquinhos conceitos. Durante milhares de anos, tentamos, vezes sem conta, com paciência de tirar Jó do sério, fazer vocês compreenderem algumas coisas, mudarem certas posturas. Tudo em vão! Continuam, ainda, depois de milhares de anos, na cronologia terrestre, porcos bestiais chafurdando na lama da Evolução Cósmica: guerras estúpidas e fratricidas continuam a serem travadas; inocentes ainda morrem, aos montes, nos países ditos do terceiro mundo, impunemente; a briga insana pelo poder ainda aniquila sonhos e ideais dos poucos homens de boa vontade remanescentes deste lamaçal; o espantalho da fome assusta e ataca, com desdém e extrema voracidade, em vários recantos do globo, sem mencionar o caos ambiental sem volta em que se meteram. Assusta-nos saber que a Ganância, a Inveja, a Avareza e o Egoísmo andam de mãos dadas e ainda campeiam soltas por este anárquico planeta, trazendo, no seu bojo, destruição e morte. Isto é uma verdadeira barbárie! Além do mais, pasmemos nós, há um maluco americano que está à solta, bushnando tudo à sua volta. Eis que o Armagedon, finalmente, por incompetência unicamente vossa, bate assustadoramente às portas. Dessa forma, na Reunião do Conselho Galáctico realizada recentemente em Urano, decidiu-se que é necessário uma mudança radical de curso dos habitantes da Terra, nem que seja na “marra” e no susto. Não há mais tempo a perder! Todas estas correções ÉTICAS de rota terão que ser realizadas até o dia 22 de dezembro de 2012, obedecendo ao primitivo calendário maia. Por isso vocês recebem este ultimato: Se nada for feito até lá, todos serão destruídos sem dó nem piedade - e expurgados ad eternum do Sistema Solar.
Sinto dizer-lhe, mon ami, mas vocês não farão falta alguma.
E o que dizer do seu belo país, com uma Natureza pródiga e que tem um povo ordeiro e trabalhador, na sua esmagadora maioria, porém pessimamente dirigido por alguns desmiolados companheiros plenipotenciários aloprados de plantão, onde a injustiça e a impunidade gargalham roucas em cada rincão deste abençoado solo? E o que falar de certos politicozinhos de meia pataca que pululam, serelepes, nas mais diferentes latitudes e longitudes, que só pensam em locupletar-se à custa do sacrifício de muitos desafortunados do destino, aumentando cada vez mais o fosso quase intransponível entre a Elite burra e a Plebe rude brasileiras, instaurando um verdadeiro pandemônio social? E o que posso exprimir sobre a abjeta laia corporativista palaciana que pratica despudoradamente a Lei de Gerson, enojando o mais simplório “bocó político”? Que asco! Isto é inaceitável.
E, por caminhos tortuosos que nem mesmo Freud explica, coube a você, criatura desqualificada, medíocre mequetrefe do sofisma, mesmo com o seu cérebro empoeirado e limitadíssimo, ser o nossa porta-voz oficial junto às incultas turbas tupiniquins.
Urge, agora, que você faça a sua parte.
Bien, mon cher, courage. Au revoir...
AVELAR SANTOS
CAMOCIM-CE
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